segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Dirceu fica de fora da equipe de Dilma, apesar do empenho com militância

 
O ex-ministro e deputado cassado José Dirceu (PT) termina a corrida presidencial magoado. Mergulhou de cabeça para ajudar a campanha da presidente eleita Dilma Rousseff. Teve agenda de candidato para fazer negociações com partidos aliados e com o PT nos estados. Entende que teve papel na vitória da “camarada em armas” ao trabalhar para não desmotivar a militância na virada do primeiro para o segundo turno. Mas está fora de qualquer montagem do futuro governo.
Dirceu acabou identificado com o grupo de mensaleiros, aloprados e sanguessugas que se meteu em escândalos nos últimos oito anos e foi limado da possibilidade de contribuir para a administração Dilma Rousseff antes mesmo de as urnas serem fechadas. O ex-ministro, no entanto, é emblemático. Apesar de dizer que não quer participar, nutria um fundo de esperança de que seria um consultor informal, uma espécie de primeiro passo para reconstruir sua carreira política para além do PT. “Não posso, não quero e não devo”, declarou ontem, depois de votar em São Paulo.

Dirceu foi satanizado pelo PSDB durante a campanha e seus colegas não o defenderam dos ataques. Não conseguiu participar, mesmo informalmente, das discussões da cúpula da campanha. O ex-ministro foi acionado apenas por petistas do segundo escalão nos estados. Antes do processo eleitoral, foi um dos principais negociadores da aliança com o PMDB. Usou o jatinho do ex-deputado Vadão Gomes (PP-SP) para percorrer o país. Foram, pelo menos, 180 viagens entre 2008 e 2009.

Articulador incansável, Dirceu comemorou o sucesso da aliança dos dois partidos, mas foi jogado na sua conta também o fracasso da eleição de Minas Gerais, onde os governistas perderam todos os cargos de destaque. Achava que, sem o estado, o acordo não sairia. Uma parte dos petistas mineiros, liderada por Fernando Pimentel, entendia ser possível forçar a barra e ter duas candidaturas.

O ex-todo-poderoso do partido sabe que não tinha chances de ocupar um posto na futura administração, mas não gostou da maneira como foi descartado. José Dirceu virou sinônimo negativo na campanha. Sua imagem piorou. Agora, concentra-se em livrar-se do processo que corre contra ele no Supremo Tribunal Federal (STF). Esse mesmo esforço será feito por outros petistas e militantes que também foram rejeitados para um futuro governo.

Faxina
O governo Lula passará o bastão a Dilma após uma faxina de mensaleiros ilustres. Sua sucessora não contará com figuras como Luiz Gushiken, que chefiou a toda-poderosa Secretaria de Comunicação do governo; José Genoino, o ex-presidente do PT que não conseguiu reeleger-se deputado; Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil; ou Professor Luizinho, o deputado que não conseguiu eleger-se vereador. Restará a esse grupo o trabalho de mobilização de militantes.

O ex-ministro da Casa Civil saiu duplamente derrotado: viu um desafeto político, o deputado Antonio Palocci (PT-SP), ganhar destaque ainda maior e tornar-se cotado para o governo.

Resta-lhe assistir, fora dos holofotes, à possível concretização de um desejo: o desenrolar de um governo mais petista do que o dos mandatos de Lula. Discursando para uma plateia amigável em setembro, o ex-ministro explicitou o que esperava de uma vitória da companheira que o sucedeu na Casa Civil. “A eleição da Dilma é mais importante do que a do Lula, porque é a eleição do projeto político. Dilma nos representa”, afirmou.

De fato, Dilma representa o PT, mas a presidente eleita quer ver Dirceu bem longe de seu governo. Ainda assim, depois de votar em São Paulo, o ex-todo-poderoso voou para Brasília a fim de comemorar a vitória da antiga companheira de luta.

OPOSIÇÃO PERDE FORÇA
>> Vinicius Sassine

A disputa foi dura e recheada de baixarias, num duelo que radicalizou a relação de contrariedade entre PT e PSDB. Nas urnas, a vantagem de votos foi pequena, numa eleição decidida em dois turnos. Uma terceira via, construída por Marina Silva (PV), promete ser oposição nos próximos anos. Mesmo assim, a presidente eleita, Dilma Rousseff (PT), terá pela frente uma oposição branda, sem diferenças significativas em relação à moderada oposição enfrentada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Dilma terá maioria absoluta no Congresso, uma coalizão mais ampla e não terá opositores históricos no Legislativo. Cientistas políticos ouvidos pelo Correio creditam a Lula mais esse mérito: o presidente incumbiu-se pessoalmente de derrotar lideranças especializadas em se opor ao PT. Sem Cesar Maia (DEM-RJ), Artur Virgílio (PSDB-AM), Tasso Jereissati (PSDB-CE), Heráclito Fortes (DEM-PI), Mão Santa (PSC-PI) e Efraim Morais (DEM-PB) no Senado, Dilma terá menos resistência pela frente e mais governabilidade, acreditam os especialistas.

Se Lula não conseguiu conquistar maioria no Senado, o que lhe rendeu derrotas políticas e administrativas, como o fim da cobrança da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), Dilma chegará com o apoio de mais de 50 senadores, entre os 81 com mandato a partir de 2011. Na Câmara, dos 513 eleitos em 3 de outubro, mais de 350 integrarão a base de apoio a Dilma.

A derrota de lideranças do PSDB e do DEM, adversários históricos do PT, foi acompanhada do encolhimento geral das duas siglas na Câmara e no Senado. As duas legendas terão 11 senadores e 35 deputados federais a menos a partir de 2011, uma redução significativa diante do avanço de partidos governistas nas duas Casas, como o próprio PT, o PSB e o PCdoB.

Composição
A oposição capitaneada pelo PSDB mantém a resistência nos maiores colégios eleitorais do país, São Paulo e Minas Gerais. Mas, para o cientista político David Fleischer, professor da Universidade de Brasília (UnB), os governadores eleitos Geraldo Alckmin e Antonio Anastasia não serão radicais. “Dilma conseguirá compor com eles”, avaliou. O encolhimento do DEM e a possibilidade de a legenda se fundir a outro partido dão melhores condições ao governo de Dilma, segundo o professor do Instituto de Ciências Políticas da UnB Ricardo Caldas. “Quem poderia fazer uma oposição mais agressiva é o DEM, mas o partido está sem rumo.”

Mas depois da fervura do segundo turno, há quem aposte em dias difíceis para a nova presidente. “A Dilma vai criar uma crise permanente no Congresso e no governo. Ela é fraca, desequilibrada e suscetível a crises políticas, econômicas e de relacionamento”, atacou o deputado federal reeleito Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR). “Vamos ser mais duros com ela do que fomos com Lula. Dilma é uma invenção, produto da vaidade do presidente.”

Tiago Pariz
Publicação: 01/11/2010 09:20

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